Próximas apresentações e workshops:

Rio de Janeiro:
- agosto: O Vestido - aguardem

E no segundo semestre tem estreia: ANGELINA!

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

6 - Ano Novo em Berlim

"E acabou que o ano novo foi engraçado...

Tudo foi dando errado... até que acabou dando certo...
Desistimos de todas as propostas... e em Berlim as pessoas agitadas soltavam bombas pelas ruas... ainda esporadicamente.
Fomos comer falafel. Só nós duas, num restaurante vazio, com apenas dois garçons. Eles ficaram com pena do ano novo "delas" ser ali, naquele boteco árabe com eles. Por isso capricharam no nosso falafel. Foi um banquete!
Meia-noite. Pela grande vitrine do bar nós duas vimos o cenário revivido de guerra em Berlim. Um horror. Bombas estourando próximas. Fumaça. A fumaça se misturava com a fumaça do passado que emergia trazendo memórias enevoadas de gritos, violência e horror.
Eu tentava me manter presente à realidade e lembrar que era apenas ano novo. Não eram bombas. Eram fogos de artifício. Eram comemorativos... mas próximos demais! Ruidozos demais! Assustadores demais! Era um campo de guerra!!!O que ficou em mim foi uma sensação ruim.
Eis que chegaram dois moços. Um alto. Um baixo. Sentaram-se à nossa mesa. Inteligentes, gentis, doces e educados. Um, filósofo e músico, o outro, cientista político. Avessos às bombas e ruídos, conversaram com as duas mulheres como se deve conversar com duas pessoas.
Fomos os quatro para um pub próximo. Ótima música! Dançamos até às cinco da manhã!

E acabou que o ano novo foi ótimo... "


5 - Embaixada do Brasil em Berlim

No dia seguinte passei a manhã toda ligando para o achados e perdidos da cidade e dos ônibus, mas não conseguia falar. Era dia 30 de dezembro. Quase ano novo. No final da manhã consegui que me atendessem mas me disseram que a bolsa não estava lá. Como sabiam que não estava se não procuraram???

Fui na delegacia perto de onde eu estava. Fui muito bem atendida. Uma policial loura, alta, maravilhosa e muito bem educada veio me ajudar. Ela foi muito gentil e fez a ocorrência para mim. Saí de lá e então fomos, eu e Duda (que me apoiou muito neste momento), para a Embaixada Brasileira em Berlim. Levei comigo meu portifólio com os solos "Mulher Selvagem" e "O Vestido" e o portifólio da Cia Mário Nascimento. Era tudo o que eu tinha que confirmava que eu era eu.

Enquanto Duda usava a internet para se comunicar com meus pais e com o Mário para conseguir que enviassem uma cópia da minha carteira de identidade, eu fui muitíssimo bem recebida lá pela responsável : Anna Treno e também por toda sua equipe. Primeira coisa que ela perguntou foi se eu estava passando fome e se tinha onde dormir. Em seguida mostrei a ela meus portifólios. E ela disse que era uma honra estar diante de uma artista. Nem preciso dizer o quanto isso me emocionou. Ainda mais depois da noite terrível que eu havia passado. E ainda mais por eu viver no Brasil, um país onde os artistas não são respeitados.
Ela me disse que com os portifólios já era claro que eu era eu. E ela os anexou à minha documentação! Naquele momento senti plenamente que a Arte é realmente tudo o que eu tenho e que ali na Alemanha isso significava algo. Se no Brasil nos respeitassem como fui respeitada  na Embaixada Brasileira em Berlim... os artistas aqui estariam em melhores condições.
 Ainda consegui cópia de alguns documentos que minha produção me enviou (dei trabalho para eles até no ano novo! rs...). Resumindo, consegui fazer um passaporte rapidíssimo.

Querida Anna Treno e equipe, minha gratidão a vocês!
Quando eu for me apresentar em Berlim, vocês serão meus convidados!

Um grande abraço com muito carinho a vocês!

Rosa Antuña
foto: Duda Las Casas


4 - Apuros em Berlim

Bem, após a residência artística no Odin fui pra Londres passar natal com meu querido amigo Giovanni Ferrari. E no ano novo fui pra Berlim.
 Pois é. Foi aí. Foi aí que complicou tudo. Cheguei sozinha em Berlim dia 29 de dezembro de 2014 às 23:00hs. Fazia 6 graus negativos. Muita neve. Minhas amigas foram antes para lá e estavam me esperando no apartamento que alugamos.

Chego no aeroporto. Entro no ônibus. O ônibus para em Alexander Platz, em frente à estação de metrô. Desço. Dou alguns passos. Percebo que a minha bolsa verde não estava mais comigo. Um instante de profundo desespero. Outro instante de negação da realidade e no terceiro instante nasce em mim a necessidade urgente de solucionar o problema.

Voltei até o ponto de ônibus e tentei pegar um taxi e dizer a ele "siga aquele ônibus!"; mas não deu certo... primeiro porque não me comuniquei bem em alemão (morei em Dresden de 96 a 98, precisaria de um tempo pra resgatar o idioma perdido nos meus recônditos cerebrais que hoje apenas armazenam informações sobre projetos de Lei de Incentivo e editais e datas e quanto está faltando de dinheiro).
Fui então para o ponto de ônibus em frente e consegui dizer para o motorista que eu havia esquecido minha bolsa verde no outro ônibus. Ele deu um aviso pelo microfone em todos os ônibus. E responderam que nada foi encontrado. Agradeci. Desolada. Fui caminhando em direção ao metrô. Na neve. Menos 6 graus. Arrastando uma mala.

Sensação de impotência! Isso merece um parágrafo à parte, sem sombra de dúvida! Pois ali, naquele momento, pude corporificar, pude sentir plenamente, pude viver uma situação bem didática que demonstrava claramente o que é uma situação de impotência. Eu sabia que minha bolsa estava no ônibus. Sabia que o Ônibus estava indo para a garagem. Mas eu mal falava o idioma, não tinha nenhum documento(nem o passaporte), não tinha nem um centavo, nem um cartão de crédito, nem o celular, nem o tablet, nem minha agenda (com o endereço do apartamento onde eu ficaria hospedada) e nem uma barra de chocolate. Eu ali não era ninguém. Sem dinheiro, eu não tinha direito a nada. Fui reduzida instantaneamente a um floco de neve (isso porque eu estava na Alemanha, pois se eu estivesse no Brasil teria sido reduzida instantaneamente a uma bolota de merda).

Fui até a estação de metrô. E em vão tentei falar com um rapaz que trabalhava lá... mas ele apenas me disse onde era a polícia. Já era quase meia-noite. O movimento de pessoas nas ruas já havia reduzido bastante. Saí perambulando à procura da polícia. Não encontrei. É claro que Pai Benedito e todos os meus mentores estavam comigo e não me esqueci disso nem um momento. Passei em frente a um bar e havia um rapazinho simpático. Perguntei a ele onde era a polícia. Ele era argentino e pudemos falar em espanhol. Ele achou estranho e me perguntou para que eu queria ir na polícia. Ali não aguentei mais e abri a boca a chorar! Contei tudo. O que mais me afligia é que eu não tinha o endereço para onde eu deveria ir e as meninas tinham me dito que onde elas estavam estava sem internet!!!!! Bem, ele me chamou para entrar no bar, me pagou uma água e deixou que eu usasse a internet do celular dele. No meu facebook tinha inbox o endereço para onde eu deveria ir. E consegui pedir que amigos avisassem meus pais para cancelar meus cartões de crédito. O Lucas (o argentino) foi comigo até a polícia mas me mandaram esperar até o outro dia e me deram um telefone de achados e perdidos para eu ficar ligando. O Lucas foi extremamente gentil e atencioso e foi quem também me ajudou a pegar o taxi para o ap. Chegando no apartamento subi e pedi para a Duda pagar o taxi para mim.

Passei mal a noite inteira. Não conseguia acreditar que eu tinha esquecida minha bolsa verde com todo meu dinheiro e passaporte e tablet e celular e agenda e chocolate no ônibus em Berlim.

foto : Duda Las Casas