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domingo, 30 de setembro de 2012

O casamento com a Dança

É um conflito.
Uma contradição.
Uma necessidade.

Todo coreógrafo de grupo, para consolidar sua linguagem, precisa ter um elenco que fique com ele por muitos anos para que haja realmente uma apropriaçãoda movimentação, um amadurecimento artístico e domínio e desenvolvimento da linguagem proposta.
E quando os artistas chegam nesse nível de excelência o que acontece? Saem do grupo e vão para outro. Entram novos bailarinos no lugar e começa-se tudo outra vez. Só que dessa vez os bailarinos ficam ainda menos tempo e já saem. E vem uma nova leva.

E por aí vai... os coreógrafos sempre recomeçando... e o trabalho para crescer mais precisa de tempo e de maturidade. Estamos falando de obras de arte e não apenas de mero entretenimento. Existem companhias que precisam de bailarinos muito técnicos e eficientes, que aprendem as coreografias rápido, executam tudo muito bem...para essas é um pouco menos pior... mas para os coreógrafos que constroem uma linguagem ao longo da vida essa mudança toda é muito difícil.

E acredito que para o bailarino isso também não seja bom, pois ele também precisa de tempo para se apropriar, amadurecer uma linguagem em seu corpo e então desfrutar disso, dançando com mais domínio e aprofundamento. Mas os bailarinos interrompem  esse processo deles mesmos... uma pena. Pois isso enfraquece a dança. Isso enfraquece a formação e experiência desses bailarinos... vai ficando tudo mais superficial...

Mesmo para as grandes companhias de dança, onde há mais praticidade nas trocas de elenco, pois basta encontrar outro bailarino eficiente e com boa técnica, mesmo nessas cias é complicado... pois se um elenco fica mais tempo junto, a cia acaba criando "uma cara", o que é positivo. Cria-se uma identidade. E quando a rotatividade é intensa demais, isso dificulta a criação dessa identidade.

Trabalhar em uma cia de dança é um casamento. Pode chegar um momento onde perdemos a paixão, o tesão... e então podemos "terminar" e em ir em busca de outra cia... ou podemos ter "amantes"! Para isso é melhor que seja um relacionamento abertop e tudo seja conversado, ou seja, paralelamente ao seu trabalho com determinada cia, você pode começar a desenvolver uma carreira solo, coreografar ou dar aulas para outros grupos ou escolas, fazer projetos com outras parcerias... mas isso tem a hora certa de acontecer. E não será igual para todos. Outros terão outros interesses como fazer uma faculdade, estudar idiomas, música, etc. E também é importante que tudo seja conversado e transparente para que não seja criado nenhum mal estar ou conflito e é claro, como no casamento, que existe uma prioridade: o cônjuge!
Também para o coreógrafo isso precisa acontecer. É importante que ele viaje para se reciclar, trabalhe com outros grupos e artistas, pois isso o renovará para voltar e trabalhar com seu próprio elenco! Todas as experiências adquiridas fora, serão ricas para serem trocadas nesse "casamento"! Por que não? Sim... aplico aqui a filosofia do Osho...

É muito difícil manter grupos e acredito que isso está ficando cada vez mais difícil. Na maioria das carreiras, quando o profissional chega aos seus 35, 40 anos de idade, se ele tiver um excelente currículo, com cursos de especialização, se for extremamente competente, ele será promovido e isso significa que ganhará mais dibheiro. Ele será "ocidentalmente" reconhecido pela sua competência, ganhando mais dinheiro.

Na dança isso não acontece, pois os projetos nivelam todos por baixo. Jovens iniciantes, amadores e profissionais... e são pouquíssimas as cias de dança que têm condições de pagar um salário melhor para os bailarinos. Acho que isso também interfere  muito nessa alta rotatividade do elenco. Quando um bailarino vai chegando nos 30 anos, vai sendo tomado por um desespero ao pensar: " o que farei quando parar de dançar?". Pois não existe aposentadoria para bailarino, muito menos se você vive de projetos. Os salários não melhoram ao longo da sua carreira. E aí? E então que esses bailarinos procuram ir para grandes cias de dança que pagam melhor e dão prestígio, mesmo se eles não gostarem do tipo de trabalho que é feito nelas. Pronto. Eis o problema. É claro que muitos bailarinos gostam da sua grande cia e do trabalho. Mas outros estão apenas pela aparente estabilidade financeira, o que é muito triste em se tratando de arte. Todas as cias de dança precisam de um elenco apaixonado que acredite no trabalho, na proposta, no coreógrafo... estamos falando de ARTE, não de burocracia... isso me entristece um pouco... pois se já sabemos da realidade da falta de respeito com nosso trabalho hoje, ou você vai com tudo e se arrisca e assume esses riscos... ou você faz um concurso público e aí vai mesmo ganhar dinheiro.

Se todas as cias de dança, grandes e pequenas tivessem um bom salário... isso já ajudaria muito, pois se todos ganhassem bem, os bailarinos procurariam os grupos com os quais realmente se identificassem e isso faria com que a qualidade dos trabalhos fosse ainda melhor e que bailarinos conseguissem manter viva a sua chama como artistas!

Precisamos sim, de mais respeito nesse país para com a nossa classe, mas nós devemos primeiramente este respeito a nós mesmos e ao nosso trabalho. Para que escolhemos dançar? Se escolhemos isso, então vamos até o fim. Dancemos. E dancemos com técnica, com estudo, com treinamento, com qualidade, com filosofia, com ideologia, com prazer, com o coração e com a alma. Dancemos inteiros. Pois a dança precisa de artistas inteiros. A dança é inteira.

Os coreógrafos se encantarão por aqueles, que, mais do que bailarinos, forem ARTISTAS. Os coreógrafos se apaixonarão por aqueles que se entregarem para eles. Os coreógrafos se inspirarão por aqueles que se apropriarem da sua proposta e a transformarem em um diamante. É primoroso ser intérprete e ser dirigido. Essa mania de todos quererem se dirigir virou uma grande bagunça. Os jovens precisam aprender. Precisam de formação. Precisam de experiência e precisam de tempo de amadurecimento.

Participamos de uma grande engrenagem. E cada um de nós é fundamentalnela. Precusamos fazer a parte que nos cabe. Todos juntos moveremos A DANÇA. É preciso que haja bailarinos que decorem coreografias rápido, é preciso de bailarinos improvisadores, é preciso de coreógrafos, pesquisadores, acadêmicos, críticos, profesores, grupos pequenos, grupos enormes... todos somos importantes e necessários para servir à dança. E conscientes da nossa importância e do nosso papel poderemos conquistar melhores condições de trabalho para nós.

Não acho que este seja um assunto que chegará a uma conclusão em um simples texto. É sim um assunto bastante complexo, mas que pede a nossa atenção como classe da dança. Pede a nossa reflexão em prol da dança e da sua evolução tanto artística, quanto estrutural, política, social e econômica.

Danço. Logo existo!

Rosa Antuña

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